quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

20160113 Hegel detonando







"Fenomenologia do Espírito" 
Volume 1

C - A individualidade que é para si real em si e para si mesma, 244
a. O reino animal do espírito e a impostura, ou a Coisa mesma, 246
b. A razão legisladora, 260
c. A razão examinando as leis, 264

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Nos dois itens trazidos Hegel, através da lógica vai destruindo o cerne de afirmações tidas por Verdades Universais.
Nada disso, se você tiver tempo para ler. 

É uma leitura complexa, eu admito.
Mas vale a pena passar os olhos.

Ontem, no programa "Provocações" Abu entrevistava Vladimir Safatle, e este disse ter ouvido de um professor ou coisa assim:
"Quem chega a Hegel jamais sai dele."

Não sou hegeliano e não sou nada de nada.
Mas alguns espíritos e suas obras merecem respeito. Hegel está entre eles.
Vamos lá!

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b - A RAZÃO LEGISLADORA


424 - [Jeder soll die] "Cada um deve falar a verdade." Nesse dever que se enuncia como incondicionado vai-se logo admitir a condição: "se souber a verdade". O mandamento, pois, será agora assim enunciado: Cada um deve falar a verdade, sempre segundo seu conhecimento e convicção a respeito dela. A sã razão, justamente essa consciência ética que sabe imediatamente o que é justo e bom, explicará também que esta condição já estava de tal modo unida à sua máxima universal que ela sempre assim entendeu aquele mandamento. Mas dessa maneira admite que, de fato, ao
enunciar a máxima já a infringe, imediatamente. Dizia: "cada um deve falar a verdade"; mas entendia: "de acordo com seu conhecimento e convicção sobre ela"

Isto é, falava uma coisa e entendia outra; ora, falar diversamente do que se entende, significa não falar a verdade. Uma vez corrigida a inverdade ou a inabilidade, a máxima agora assim se exprime: "Cada um deve falar a verdade conforme o conhecimento e a convicção que dela tenha em cada caso." Mas, com isso, a necessidade universal, o válido em si que a máxima queria enunciar, se inverte antes numa completa contingência.

Com efeito: que a verdade deva ser dita, depende de uma contingência: se é que eu conheço; se é que estou convencido a respeito. [Assim] não se enuncia nada mais do que isto: que se deve dizer o verdadeiro e o falso misturados, conforme suceda que alguém os conheça, entenda ou conceba. 

Essa contingência do conteúdo tem a universalidade só na forma de uma proposição, sob a qual se expressa; porém como máxima ética promete um conteúdo universal e necessário e assim contradiz a si mesma pela contingência do conteúdo. Finalmente, se a máxima for corrigida [dizendo] que se deve evitar a contingência do conhecimento e da convicção acerca da verdade, e que a verdade deve também ser conhecida - isso seria um mandamento que contradiz frontalmente o ponto de partida. Primeiro, a sã razão devia ter imediatamente a capacidade de enunciar a verdade; mas 
agora se diz que devia sabê-la. 

Quer dizer: a sã razão não sabe exprimi-la imediatamente. Considerando do lado do conteúdo, esse então é descartado na exigência de que se deve conhecer a verdade, posto que tal exigência se refere ao saber em geral: "deve-se saber". Portanto o que é exigido é algo que está, antes, livre de todo conteúdo determinado. Ora, o que estava em questão aqui era um conteúdo determinado, uma diferença na substância ética. Só que essa determinação imediata da substância ética é um conteúdo que se manifesta como uma completa contingência; e ao ser elevado à universalidade e à necessidade - de modo que o saber seja enunciado como lei - antes desvanece.



425 - [Ein anderes berühmtes] Outro mandamento famoso é: 
"Ama o próximo como a ti mesmo". É dirigido ao indivíduo em relação aos indivíduos; a relação é afirmada como do singular para com o singular, ou como uma relação de sentimento. O amor ativo - pois o inativo não tem ser nenhum e portanto não está em questão - visa afastar o mal de um homem e lhe trazer o bem. 

Para esse efeito é preciso distinguir o que é o mal para o homem, e qual é o bem apropriado contra esse mal; e em geral, o que é sua felicidade.

Quer dizer: devo amar o próximo com inteligência, um amor ininteligente talvez lhe faria mais dano que o ódio.

Mas o bem-fazer essencial e inteligente é, em sua figura mais rica e mais importante, o agir inteligente universal do Estado.

Comparado com esse agir, o agir do indivíduo como indivíduo é, em geral, algo tão insignificante que quase não vale a pena falar dele. Aliás, aquele agir é de tão grande potência que se o agir singular se lhe quisesse opor - ou ser exclusivamente para si no delito, ou então por amor a outrem - defraudando o universal quanto ao direito e à parte que lhe cabe no singular, isso seria totalmente inútil e irresistivelmente destruído.

Resta ao bem-fazer, que é sentimento, apenas a significação de um agir inteiramente singular: uma assistência que é tão contingente quanto momentânea. O acaso não só determina a ocasião da obra, mas determina também se é uma obra em geral, se ela não volta a dissolver-se logo, e mesmo a converter-se em mal. Assim, esse agir em benefício dos outros, que se enuncia como necessário, é de tal modo constituído que talvez possa existir, talvez não; e que, se a ocasião se oferece fortuitamente, pode ser uma obra, talvez boa, talvez não.

Com isso essa lei tem um conteúdo tão pouco universal quanto a primeira já analisada, e não exprime algo em si e para si - como deveria, enquanto lei ética absoluta. Vale dizer: tais leis ficam somente no dever-ser, mas não têm nenhuma efetividade: não são leis, mas apenas mandamentos.


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Nota: 

Quando Hegel fala de Estado, não pense no que conhecemos. 

O Estado de Hegel é o Estado Ideal, onde todos são verdadeiros cidadãos, e o governante serve aos cidadãos dentro de seus limites.

Isto feito, uma observação:

Os discursos todos, ouvidos ao longo do tempo, não são apenas formas de nos dominar mais facilmente?

São dúvidas que me assaltam, exatamente por não acreditar em nada mais, apenas na dúvida.


Paulo Cessar Fernandes.

13/01/2016.

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